A nossa música - em destaque:

"Eu tenho essa coisa de puto, que é achar que o presente se digna sempre a vir ter connosco, sorrateira ou ruidosamente.
Fui ter então com uns quantos músicos, instrumentistas, cantores, cantoras, e dei-lhes o que tinha a dar, as minhas canções como pretendentes prometidas: casa-não-casa, no fundo convites honestos à prática da bigamia.
Como a fome vai ao osso, o certo é que todos se deram valorosamente à tarefa.
E nos breves encontros, trocamos muita informação, pintores trocando tintas, criando, cada forma e cada cor, o seu fresco colectivo.
Seja dito que nada disto é definitivo.
Nunca vi qualquer canção como sendo prisioneira, ou de si mesmo salvadora.
Ela raspa no chão, arranca e ataca, e logo se imobiliza: assim respira, à espera de quem a ouça e a reconheça.

Não sou obrigado ao obrigado que vos devo: antes o faço com o mais imenso prazer.
Vocês deram-se à tarefa, como a fome foi ao osso, como muito duro osso se roeu, como a roupa se desprendeu e se colou ao corpo; e o que tinha um ou dois sentidos passou a ter mais um ou dois. Letra na letra, música na música, bigamias tanto passageiras como sustentáveis, e o irmão do meio revolvendo feliz no turbilhão da família em permanente resolução."